32ª Mostra de SP começa com o drama "Terra Vermelha"

Uma sessão especial para convidados do drama "Terra Vermelha", de Marco Bechis, abre nesta quinta (16) a 32ª edição da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, no Auditório Ibirapuera. A Mostra abre sua programação normal na sexta (17) e vai até o dia 30.

Co-produção ítalo-brasileira que concorreu ao Leão de Ouro no último Festival de Veneza, o filme do chileno Bechis (diretor de "Garagem Olimpo") vai fundo na questão indígena e na propriedade da terra no Brasil. O roteiro, co-escrito por Bechis e pelo brasileiro Luiz Bolognesi ("Chega de Saudade"), coloca em primeiro plano a luta de um pequeno grupo de índios caiwoáa para retomar o território original de sua tribo e que, há décadas, foi ocupado e transformado em lucrativo agronegócio pela família de um rico fazendeiro (Leonardo Medeiros).

"Terra Vermelha", de Marco Bechis, foi o filme escolhido para abrir a 32ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo

Filmado na região de Dourados (MS), "Terra Vermelha" ganha maior autenticidade ao escalar índios reais para interpretar seus próprios papéis, caso de Nádio (Ambrósio Vilhalva), que interpreta o cacique do filme e também na vida real exerce a mesma função.

Ao escalar índios para reviverem seus dramas reais na tela, "Terra Vermelha" utiliza o mesmo e eficiente recurso de outro filme brasileiro, o premiado "Serras da Desordem", de Andrea Tonacci, embora com outro estilo e intenções. Este detalhe, em todo caso, foi fundamental para a grande repercussão do filme de Bechis quando foi exibido na competição principal em Veneza, em setembro último. Na ocasião, alguns índios do elenco, como o próprio Vilhava, discutiram problemas dramáticos de seu povo, como o suicídio entre os jovens - tema que desencadeia o roteiro de "Terra Vermelha". O filme será exibido na programação da Mostra nesta sexta (17), às 16h no Cine Bombril 1; na terça (21), às 18h10, no Reserva Cultural 1; e na quarta (29), às 20h, no Cine Bombril 1.

"Terra Vermelha" é um dos 454 filmes que fazem parte da, como sempre, volumosa programação da Mostra, que este ano se divide entre 242 filmes em película 35 mm e outros 212 digitais - comprovando o avanço da nova tecnologia.

Setenta e seis países estão representados neste diversificado bloco cinematográfico, entre eles, o quase desconhecido Casaquistão, que será dignamente representado pelo inédito "Tulpan", de Sergey Dvortsevoy, que venceu o prêmio principal do Un Certain Regard, principal seção paralela do Festival de Cannes, em 2008. Trata-se de uma saborosa comédia dramática, sobre o esforço de um rapaz para casar-se com a única, bela e difícil moça de sua região rural.

Do grupo dos filmes inéditos trazidos pela Mostra, faz parte igualmente o longuíssimo "Che", a visão de mais de quatro horas de Steven Soderbergh para o revolucionário argentino, interpretado por Benicio del Toro, que venceu o prêmio de melhor ator no Festival de Cannes 2008. Del Toro é, aliás, um dos convidados VIP esperados neste ano. Além dele, anuncia-se a presença de Wim Wenders, que será homenageado com o troféu Humanidade e exibirá também seu mais recente - e discutido - trabalho, "Palermo Shooting", que concorreu à Palma em Cannes.

Outra personalidade aguardada é o cineasta norte-americano Hugh Hudson ("Carruagens de Fogo"), um dos jurados, e que trará na bagagem uma nova versão de um filme maldito em sua carreira, "Revolução Revisitada". Trata-se de uma releitura de seu filme de 1987, "Revolution", que recebeu inclusive uma nova narração de seu ator principal, Al Pacino.

Do júri deste ano, fazem parte ainda a cineasta iraniana Samira Makhmalbaf (que traz seu novo filme, "Cavalo de Duas Patas") e o francês Nicolas Klotz (diretor de "A Questão Humana", prêmio da crítica na Mostra 2007).

Homenageado com a retrospectiva integral de seus cinco filmes, inclusive o mais recente, "Leonera", o diretor argentino Pablo Trapero vem a São Paulo para ministrar uma oficina de direção na FAAP, na segunda (20), para a qual as inscrições estão encerradas.

MAIS INÉDITOS

Entre os filmes inéditos da programação, um dos maiores destaques é o documentário brasileiro "Garapa", do premiado José Padilha (Urso de Ouro em Berlim por "Tropa de Elite"), que tem na Mostra sua pré-estréia mundial. O tema do filme é a fome no mundo, enfocada do ponto de vista daqueles que a sofrem.

Outro documentário de primeira é a "A Vida Moderna", em que o diretor francês Raymond Depardon revisita personagens de um filme anterior, atualizando um emocionado retrato da vida camponesa na França.

Vindo também da seção Un Certain Regard de Cannes, o drama "Depois da Escola" tem o Brasil no DNA. Trata-se do longa de estréia de Antônio Campos, filho do jornalista Lucas Mendes, nascido em Nova York, e que encena aqui uma história claustrofóbica e atual, em torno de adolescentes ricos e perdidos que se envolvem num crime de morte numa escola.

O inédito documentário "24 City", do chinês Jia Zhang-ke, reconstitui a transformação do complexo industrial de Chengdu

Será possível conferir também as diferenças entre os dois competidores turcos à Palma em Cannes, os dramas "Leite", de Semih Kaplanoglu, e "Three Monkeys", este um peculiar triângulo amoroso do já conhecido cineasta Nuri Bilge Ceylan (diretor de "Climates" e "Distante", exibidos em Mostras anteriores).

Homenageado em 2007 com uma retrospectiva na Mostra, o chinês Jia Zhang-ke está representado na seleção deste ano com o inédito "24 City", documentário que reconstitui a drástica transformação da região de Chengdu, de complexo industrial na era comunista a conjunto de condomínios habitacionais de luxo na atualidade. De Jia, será exibido também o curta ficcional "Cry me a River", que teve sua première no Festival de Veneza.

Da competição principal de Veneza, vem igualmente "Teza", de Haile Gerima, uma co-produção entre Etiópia, Alemanha e França que investiga as atrocidades das últimas décadas naquele país africano a partir da história pessoal de um intelectual exilado (Aaron Arefe). O filme venceu o Prêmio Especial do Júri e também o de melhor roteiro em Veneza.

De um dos cineastas revelados no Brasil pela Mostra, o holandês Jos Stelling ("O Homem da Linha", "O Ilusionista"), foi programado um trabalho recente, "Duska" (2007), que conta a história de um ex-crítico de cinema que recebe a visita de um estranho personagem.

Ator conhecido especialmente por seus papéis cômicos ou de gângster, o norte-americano Stanley Tucci retoma em "Encontro às Cegas" o lado diretor que revelou em "Os Impostores" (98). Trata-se da refilmagem de uma história do diretor holandês Theo Van Gogh, assassinado em 2004 por fundamentalistas inconformados com o retrato do Islã que mostrou em seu filme "Submission Part 1".

CLÁSSICOS

A partir do sábado (25), a Mostra começa a exibir, pela primeira vez em 35 mm no Brasil, as mais de 15 horas da série "Berlin Alexanderplatz", de Rainer Werner Fassbinder, originalmente lançada em 1980. A série já fora mostrada pela Mostra, em 1985, e também pela TV Cultura. Logo mais, será lançada também em dvd pelo selo Versátil.

Outra jóia em cópia 35 mm será "O Poderoso Chefão" (1972), de Francis Ford Coppola. Ao contrário do Festival do Rio, onde o filme teve uma única exibição, "O Poderoso Chefão" terá duas sessões no Cinesesc. Serão no sábado (18), às 21h, e no domingo (19), às 17h20.

"O Poderoso Chefão", clássico de Francis Ford Coppola, será exibido, em 35 mm, no Cinesesc em duas sessões

As retrospectivas desta edição homenageiam o sueco Ingmar Bergman - de quem se mostram filmes do início da carreira, como "Crise" (1946) - e o japonês Kihachi Okamoto (1924-2005), pioneiro de um cinema de samurai e de guerra, de quem serão exibidos 14 filmes.

Mantendo a tradição de que a Mostra não é só cinema, mas também música, estão previstos dois shows. Um, da atriz e diretora portuguesa Maria de Medeiros, no encerramento da Mostra, em 30 de outubro. O outro, será "Retransformafrikando", um "filme-show" com André Abujamra, compositor habitual das vinhetas da Mostra, em data e local a confirmar.